terça-feira, 24 de março de 2015

A morte de um POETA

EM MEMÓRIA DO POETA HERBERTO HELDER (1930 - 2015)



Em 1994, foi-lhe atribuído o Prémio Pessoa pela sua obra. 
Herberto Helder recusou a distinção, uma das mais importantes atribuídas em Portugal.
Sempre avesso às luzes da ribalta literária e intelectual, Herberto Helder manteve-se longe das entrevistas, das honras e dos prémios.
Um homem fora do comum, sem dúvida, ao solicitar ao júri do Prémio Pessoa que não o anunciassem como vencedor e que dessem o Prémio a outro.
Um Poeta que viveu sem que os outros intelectuais o escutassem para além dos seus escritos, para além do valor invulgar com que cruzava as palavras, para além da sobriedade de uma matéria-prima com que esculpiu a própria  arte.
Um Poeta que não deixou a sua pequena ilha da Madeira, senão para a reencontrar sempre nos seus poemas a assumirem uma policromia a rasar a humildade visceral do seu autor.

                                                            Teresa Ferrer Passos


Como derradeira homenagem lembramos alguns dos seus versos carregados de inovação e singularidade:

                                           O tempo.
Acrescentou-se um pórtico aos pórticos,
um terraço aos terraços. É um friso
fantástico com uma cidade incompleta.
Aqui a nave atinge alturas
desconexas: o tempo.
Ouves o grito dos mortos?
                                        - O tempo

É preciso criar palavras, sons, palavras
vivas, obscuras, terríveis.
É preciso criar os mortos pela força
magnética das palavras.»



       Herberto Helder, Ou O Poema Contínuo - Súmula, 2001, p.38.



«Poucos foram os que durante os últimos cem anos tanto fizeram pela construção da língua portuguesa e tão influentes foram na organização da linguagem poética contemporânea.»

«A sua concentração em torno do seu ofício, ignorando e recusando formas de espaço público para lá da sua escrita, são um dos sinais da sua determinação relativamente a um discurso sobre o seu trabalho e sobre a sua presença.»

   Jorge Barreto Xavier, Secretário de Estado da Cultura


segunda-feira, 16 de março de 2015

PÁSCOA/2015


«O espírito é que dá vida, a carne não serve para nada. As palavras que Eu vos disse são espírito e vida. Mas há alguns de vós que não acreditam»
                                                        Jo 6, 63


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A PÁSCOA DE S. FRANCISCO DE ASSIS




Guiado pelo teu louco amor por tudo
Penetraste o núcleo de dor da existência
Passando a porta estreita proposta por Jesus
Que te esperava lá
No centro de tudo
No cume do mundo
No centro de ti
No fundo desse abismo assustador
Que enlouquece aqueles que preferem não ter de o recordar

Voltaste trazendo as Santas Chagas
A marca da Verdade sobre a carne
E a certeza de que o segredo desvairado
Que o Mestre dos Mestres ensinara
É bem mais certo que o mais sensato teorema:

Renunciar a tudo é ter o mundo inteiro

19/3/2015

                         Fernando Henrique de Passos


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AS PRIMÍCIAS DA PALAVRA

Igreja de S. João de Gatão, Amarante

«A Verdade é aquilo em que nós acreditamos.»
Teixeira de Pascoaes

                                                   (convoco, para a Musa-Madre, o 10 de Copas Arcano)

Q' rido Sol, a ser essénio,
O meu Cristo é só d' Amor.
Sou do Espírito e convénio,
É da Paz o Bom Pastor.

E se o Verbo, irmão, te inspira,
Se é da quadra uma quimera,
Sou do Espírito e a Lira,
É da Páscoa a Primavera.

Se o mar é barca, e Maria,
Se é da Paz, d' Iria Cova,
Sou do Espírito, e da Via,
É da Páscoa a Boa Nova.

E se a Mena doura e dança,
Se é da loura, lis e lais,
Sou do Espírito e a Esp'rança:
É da Páscoa Pascoaes.

Queluz, 19/ 03/ 2015

AD MAJOREM DEI GLORIAM

                     Paulo Jorge Brito e Abreu


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A DESCRENÇA CRIADORA DA FÉ



«O apóstolo Tomé, à vista do Ressuscitado, terá sido realmente liberto, para sempre, de todas as suas dúvidas, ou, pelo contrário, ter-lhe-á Jesus mostrado, "pelas suas chagas", o único lugar em que aquele que busca e o que duvida podem efetivamente "tocar Deus"?»

«Jesus identificou-se com todos os pequeninos e com os que sofrem – assim todas as feridas dolorosas, todo o sofrimento do mundo e da humanidade, são «as chagas de Cristo». Crer em Cristo, poder dizer «meu Senhor e meu Deus», só posso fazê-lo se tocar nestas suas feridas, de que também o nosso mundo está, hoje, cheio.»

«Onde tu tocares no sofrimento humano – e talvez só aí! – ficas a saber que eu estou vivo, que «Eu sou». Encontras-me por toda a parte onde os homens sofrem.»


Tomás Halík, O Meu Deus é um Deus Ferido, Paulinas Editora, 2015.


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A PÁSCOA DAS CRIANÇAS INOCENTES  
  

À beira da Cruz agitam-se frases infames.
O desdém sobe até às divinas tábuas.
É a Cruz com uma nova Páscoa
para as crianças desfalecidas de mágoa.
Os seus braços largos estendem-se
ao  verem os malvados derrubar a criança.

As mãos impuras incendeiam as suas faces.
Uns levantam-se e querem livrar
os inocentes das mãos dos malvados.
Outros, defendem o seu 'bom nome',
os desvarios já foram castigados.
A Cruz dá os longos braços.

Mas as crianças inocentes não lhes chegam.
Os pequenos bracinhos temem
as investidas dos malvados.
E a serena Cruz escuta, abismada.
“As crianças inocentes não valem
mais do que os malvados, estes
devem ter novas oportunidades”.

As palavras confundem a Cruz que oscila fundo.
Estremece. As tábuas vergam.
Vive-se uma densa escuridão.
O silêncio parece eterno.
O abandono é visível.
Os braços da Cruz em pedaços, caem por terra.
Desmorona-se. Como pode oferecer os seus
braços às crianças inocentes?

E desfalecida, a Cruz ainda consegue escutar.
“Que importa defender as crianças inocentes?
Para que servem? O corpo desfigurado.
Mutilado. Se ainda não são pessoas crescidas,
que importa vê-las perigar?”
Então, as crianças inocentes veem
um braço da Cruz a elevar-se.
E ouvem estas palavras:
“Importa, sim. São puras. Basta”.

15 de Março de 2015
                                    Teresa Ferrer Passos


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O QUE ESTÁ PARA VIR


«"Redivivo. E foi por essa mínima palavra que apareceu não/ se sabe o quê que arrancou/ à folha e à esferográfica canhota a poderosa superfície/ de Deus, e assim é/ que te encontraste redivivo, tu que tinhas morrido um momento antes,/ apenas"» (Herberto Helder, Ou o Poema Contínuo, 2001,p.126)

«Redivivo. Foi por essa mínima palavra que fui reler o penúltimo versículo do Antigo Testamento e aprender, em comentários da apocalíptica judaica, que redivivo é «o que está para vir», o que há de apascentar, da opacidade à luz, os corações.

E que, depois, cheguei a um dos primeiros textos cristãos, o Evangelho de Lucas, sobre o qual passo os dias a trabalhar, para descobrir também aí, nesse texto que está, afinal, tão perto de mim, a palavra redivivo.

Para minha surpresa era a interrogação que João Batista mandou, por emissários, colocar a Jesus de Nazareth: "És tu o redivivo?". Não sei de pergunta mais bela que um homem tenha feito a outro homem.»

                  José Tolentino de Mendonça (in Internet, Pastoral da Cultura, publicado em 24/3/2015)

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S. BENTO À PROCURA DE CUMPRIR JESUS CRISTO


S. Bento da Porta Aberta, Santo Tirso

O Santuário de S. Bento da Porta Aberta foi elevado a Basílica Menor, hoje, dia 21 de Março, pelo Papa Francisco, data em que se comemora o dia da morte de S. Bento. Proclamado Padroeiro da Europa, em 1964, por Paulo VI, foi o autor da célebre expressão «Ora et labora» («Reza e trabalha»)
De facto, para S. Bento (480-547), «o trabalho não é um puro exercício ascético, a não ser que conserve o seu próprio valor como meio de produção utilitário. Com o trabalho não se pretende a mortificação do corpo, mas fazer do mosteiro uma unidade económica capaz de satisfazer a maior parte das necessidades da vida. Por isso, é o trabalho manual bem organizado, atendendo às pessoas, aos lugares e às necessidades e ocupa a maior parte das horas do dia monástico. (...) O mosteiro beneditino não pretende mais do que ser a realização da comunidade cristã ideal». («Introduccion General», in San Benito Su Vida y su Regla, Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, 1968, pp.110 e 140) 
“Quem passar por aqui deve levar este encargo de mostrar que o "ora et labora" tem alguma coisa a dizer ao dia-a-dia das pessoas”, afirmou D. Jorge Ortiga, bispo da diocese de Braga, referindo-se ao lema de S. Bento e à sua pleno atualidade.
Deste modo, neste tempo de Páscoa de 2015, se recorda, em Portugal, a capacidade inovadora de Bento de Núrcia, ao elevar-se um dos santuários que, na Europa, lhe é consagrado, à dignidade de Basílica.
Que a obra de S. Bento, a expandir-se, desde o século VI, com a fundação de numerosos mosteiros por toda a Europa (desde a primeira fundação no Monte Cassino em Itália), seja o dinamizador de uma nova civilização mundial, assente na fraternidade cristã e na paz (lema da Ordem Beneditina).
Que a nova civilização que urge erguer, possua, como possuiu no pensamento de S. Bento, uma dinâmica condutora ao respeito pelos valores espirituais que Cristo transmitiu, sem perder de vista a importância que a produção económica contem para todos os homens. 
T.F.P.
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A ETERNIDADE ESTÁ FORA DO MUNDO TEMPORAL



«Se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz, dia após dia, e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á, mas quem perder a sua vida por Minha causa, salvá-la-á. Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, perdendo-se ou condenando-se a si mesmo?»
                                                           Lc 9, 23-25



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VIA SACRA




Que saco!
Resmunga o cidadão,
Agendando a correção
De um erro que não foi seu.

Oh! Meu!
Murmura o consumidor,
De volta ao vendedor
De um aparelho que pifou.

Qualé, m’ermão!
Diz um jovem a outro gajo,
Na recusa do bagulho,
Hoje, em dia, em cada esquina.

Santo Deus! Mas que rotina,
Mais uma Semana Santa,
Cada vez com menos dias,
À vida santificada.

Eis-me, aqui, Senhor,
À Vossa disposição,
Este humilde servidor,
Ainda na flor da idade.


                       Luiz Martins da Silva (Brasília, Brasil)


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BOA PÁSCOA
aos leitores do nosso Blogue!

domingo, 15 de março de 2015

A pedofilia: um problema grave





«Destruir uma criatura é horrível, é horrível»

«A nova comissão criada para estas situações tem como objetivo a proteção do menor, a prevenção, e não o tratamento de cada caso»
«O problema do abuso de menores é um problema grave»
«O padre tem a obrigação de fazer crescer este menino, esta menina, na santidade, no encontro com Jesus. E o que faz é destruir o encontro com Jesus»
«Os abusadores são “antropófagos” que destruíram os menores.»
                                                         Papa Francisco (excertos de uma entrevista no dia do 2º aniversário da sua eleição, a 13 de Março de 2015)

quinta-feira, 12 de março de 2015

Perguntas & Respostas

ACERCA DA MILENAR PERSISTÊNCIA DE UM RATIO DESFAVORÁVEL ENTRE A VARIÁVEL “NÚMERO DE PERGUNTAS RESPONDIDAS” E A VARIÁVEL “NÚMERO DE PERGUNTAS FORMULADAS”





Why do we never get an answer?
The Moody Blues

Pára…
Não te contraias mais…
Não queiras nada…

…Deixa-te estar em frente das perguntas,
No meio das perguntas.
Faz-te pergunta.
Tu mesmo és a pergunta.
Tu mesmo serias a resposta
Se acaso houvesse alguma forma de resposta
Que fosse mais do que a pergunta a que responde.

Não escrevas nada;
Não tentes deter as perguntas a meio do seu voo;
Deixa que esse ébrio bando de brandas borboletas
Repouse apenas quando a tua mente
Lhes oferecer poiso seguro:

A vastidão de uma planície
Sem tocas nem recantos
Nem inesperados ninhos de lacraus
Debaixo de pedras inocentes.

12/3/2015

Fernando Henrique de Passos

segunda-feira, 9 de março de 2015

A humildade de Deus

Papa Francisco na Capela de Santa Marta
(ao lado a imagem da Virgem e do Menino)

«O estilo do bom Deus não é dar show: Deus atua na humildade, no silêncio, nas coisas pequenas. (...) é possível observar isso em toda a história da salvação, a partir da Criação, em que o Senhor não pegou “a varinha mágica”, mas criou o homem com o barro.

Quando Ele quis libertar o seu povo, libertou-o pela fé e a confiança de um homem, Moisés. Quando Ele quis fazer cair a poderosa cidade de Jericó, o fez através de uma prostituta. Também para a conversão dos samaritanos, pediu o trabalho de outra pecadora. 

Quando Ele enviou David para lutar contra Golias, parecia loucura: o pequeno David diante do gigante, que tinha uma espada, tinha muitas coisas, e David apenas uma funda e pedras. Quando disse aos magos, que tinha nascido o Rei, o Grande Rei, o que eles encontram? Uma criança, uma manjedoura. As coisas simples, a humildade de Deus, este é o estilo divino, jamais um show.» 

                             Papa Francisco (Missa de 9 de Março de 2015 na Capela de Santa Marta)

quinta-feira, 5 de março de 2015

Padre António Vieira para o Papa Francisco



Uma delegação da Universidade de Lisboa ofereceu ontem a Obra Completa do Padre Jesuíta António Vieira aproveitando a ocasião do aniversário, no próximo dia 13 de Março, da eleição de Mario Bergoglio para Papa com o nome de Francisco. 
«Quatro séculos antes, Vieira criticou a inveja e a corrupção, como grandes males do mundo. No sermão de Santo Santo António aos Peixes - cujo título os portugueses tão bem conhecem - Vieira denunciou a corrupção, "os protocolos feudais que aprisionavam as nossas instituições, contrapondo que a verdadeira fidalguia está na ação; criticava a desvalorização que é feita em Portugal dos seus talentos e dos seus valores, sendo mais fácil quem nasce nesta terra encontrar reconhecimento e valorização no estrangeiro; acusava a mesquinhez e a maledicência sistemática que dificulta e desestimula quem empreende e faz o que deve ser feito". Este sermão foi pregado no Brasil, em São Luís do Maranhão em 1654.»





Projecto

Do espaço fechado
Nas circunvalações dos medos e desejos
Até à superfície horizontal imensa,
Semeada de cor e primaveras,
Vibrante de luz e de presença.
Porque esperas?

1/3/2015

Fernando Henrique de Passos

quarta-feira, 4 de março de 2015

Trilogia de Helgoland

Ilha de Helgoland (Alemanha)

O sms SECRETO DE BOHR A HEISENBERG
QUANDO ESTE SE ENCONTRAVA EM HELGOLAND

As raízes da razão mergulham na loucura
Como tentáculos descendo um precipício:
A primeira esteve no início
E a segunda estará no fim desta procura.

Não esperes clarões nem fogo-de-artifício:
A gruta da serpente é infinitamente escura
E deverás proceder ao sacrifício
Do resto de luz que em ti perdura.

9/1/2015

ÀS PORTAS DO MISTÉRIO

Estou na superfície do sol e chove intensamente.

Termina aqui o mapa que encontrei
Quando passeava no sótão de um chalé
Onde memórias de laços e de rendas
Jogavam uma partida de canasta
Entre teias de aranha e maços de jornais
Com numerações mais baixas do que o zero.

A mensagem cifrada fala em caves
Onde se guardam bibliotecas
De livros interditos a adultos.

Presumo então que devo mergulhar
E procurar debaixo das lagoas
Onde borbulha o ouro liquefeito
A sombria raiz do arco-íris.

12/1/2015

À TRANSPARÊNCIA

A madrugada despe-se dos medos.
Vejo-a pela praia entreaberta,
Quase ao alcance dos meus dedos,
Já só coberta
Por translúcidos sussurros e segredos.

A brisa está alerta
E a água que corre entre os rochedos
Aguarda a hora ‒ imprevisível e contudo certa ‒
Em que os meus sonhos serão como brinquedos
Nas mãos da luz então por fim desperta.

14/1/2015

Fernando Henrique de Passos

terça-feira, 3 de março de 2015

Sonata à lua

A lua é a razão desta presença
Na estepe que alguém me estipulou
Sem me avisar dos perigos da jornada
Nem me informar do que antes se passou

É a lua que inventa os passatempos
Com que o tempo nos enche de preguiça
E de ferrugem nos gestos e na força
Que a terra húmida cobiça

A lua é a razão da tempestade
E das areias perdidas nos desertos
Onde se passam anos de procura
E onde os passos se tornam tão incertos

Porque a lua se junta ao que é real
E seduz as vontades e convence-as
A trocarem as almas cristalinas
Pela ilusão de falsas transparências

5/1/2015

Fernando Henrique de Passos

segunda-feira, 2 de março de 2015

O Centro do Mundo

O Centro do Mundo é azul
Como azul é o mar
Como azul é o céu
Como azuis são as safiras
E como verdes são as esmeraldas
E a luz da esperança nos teus olhos
Sempre que os dois nos encontramos
A sós no Centro do Mundo

24/2/2015

Fernando Henrique de Passos

domingo, 1 de março de 2015

Recomeçar 17 anos depois...



RECOMEÇO

Encontrei a minha cabeça
E a de São João Baptista
E agora que a vida recomeça
Vou avisar todos os da lista.

(Sempre estivera em cima dos meus ombros
Mas foi preciso o prédio desabar
Para que, no meio dos escombros,
Surgisse um espelho capaz de a revelar.)

Estamos sempre às portas do Segredo,
Muitos pensamos estar numa masmorra ‒
Das ilusões criadas pelo Medo
Não há quem nos socorra?

A resposta está nos labirintos
Que o tempo vai gravando em cada vida ‒
‒ Sinais mágicos, nítidos, retintos
De uma mensagem à espera de ser lida.

… E São João perdoa a Salomé
Os filtros que ela o fez beber
E mergulha sem medo na maré
Do que há-de acontecer.

1/3/2015

                     Fernando Henrique de Passos
(Resposta ao poema "A lista negra" transcrito a seguir)


 A LISTA NEGRA

Devolvam-me a minha cabeça!
Gritou São João Baptista,
E eu com ele,
E comigo todos os outros da lista.

Os condenados não podem gritar!
Gritou Salomé,
E com ela Herodes, que estava sentado,
E com ele o povo, que estava de pé.

Do fundo de um escritório escuro e poeirento,
Bogart empunhou o revolver e disparou.
A Lua suspendeu o seu movimento
E Kennedy tombou.

A enfermeira assinou o papel,
E sussurrou, suave como mel:
Antes que me esqueça -
Por favor, devolva-me a minha cabeça.

6/7/1998
                 Fernando Henrique de Passos