quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Sinais



Os olhos sem luz do nado-morto
(No espelho do quarto do hotel do Porto)
O não descolar do aeroporto
(No espelho do quarto do hotel do Porto)
Os efeitos secundários do conforto
(No espelho do quarto do hotel do Porto)

Três riscos na cinza que cobria os dias
Três rasgões na terra, fecundando-a
Com sangue e profecias

26/2/2014

Fernando Henrique de Passos

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Liberdade e Moral


Se largarmos uma pedra, ela cai. Não há nisto nada de odioso ou assustador. O caso das cargas eléctricas é mais interessante: uma carga eléctrica pode ser repelida ou atraída por outra carga eléctrica, dependendo dos sinais de ambas. Também isto não tem nada de odioso ou assustador. Há uma lei biológica muito parecida: os organismos vivos dotados de sistema nervoso tendem a ser atraídos pelas fontes de prazer e repelidos pelas fontes de sofrimento. Chamemos LPS a esta lei: Lei do Prazer e do Sofrimento. O ser humano é um organismo vivo com sistema nervoso: está portanto sujeito à LPS. Também não há nisto nada de odioso ou assustador. Mas causa um certo incómodo, não causa? Somos como uma pedra que cai? Como um pedacinho de papel atraído por um pente que foi friccionado? Como o pólo norte de um íman repelido pelo pólo norte de outro íman? Bem, claro que não somos. Ou melhor, somos, mas só enquanto crianças de tenra idade. Em adultos não somos assim, pois não? Ou somos um bocadinho assim? Sim, uns mais, outros menos, somos todos um bocadinho escravos da LPS. E isso é desagradável, de facto. Ninguém gosta de ser escravo de nada. Todos prezamos a liberdade, seja qual for a nossa ideologia, não é? Bem, há ideologias que não prezam nada a liberdade, mas nós também não gostamos muito delas, pois não? E depois, há outra coisa. Não vale a pena dar exemplos, qualquer pessoa conhece muitos exemplos, mas a verdade é que se nos deixarmos guiar exclusivamente pela LPS, acabamos muitas vezes por fazer o mal: a outros, ou a nós próprios. E assim chegamos ao problema do mal, e entramos no domínio do odioso e/ou assustador: porque há pessoas capazes de fazer muito mal a outras pessoas, ou a si próprias, em última análise apenas porque se deixaram guiar exclusivamente pela LPS. E aqui entra a moral. A minha tese é a de que, na sua génese, as leis da moral não são os ditames arbitrários de um Deus caprichoso, antes visam apenas libertar o ser humano da escravidão da LPS. E isso é bom por duas razões: 1) pelo simples facto abstracto de ser uma libertação; 2) por acabar com todas as consequências nefastas da obediência cega à LPS. Independentemente de permitir uma reavaliação do verdadeiro significado da moral tradicional, tão ridicularizada pelo pensamento moderno, este ponto de vista parece-me útil para o combate que (quase) todos travamos contra o mal: se pensarmos no mal como o resultado de algo semelhante à tendência de uma pedra para cair, isso já não nos desperta sentimentos nem de ódio nem de medo. O que é bom, porque do ódio e do medo só pode nascer mais mal. (Embora uma pedra que cai sem quaisquer entraves acabe por ir mergulhando em abismos sempre mais e mais profundos, o que também é um bocado assustador…)


20/2/2014

Fernando Henrique de Passos

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

A procura divina


«Aquele que caminha sem deixar pegadas não serve para nada»

«Jesus não estava o dia trancado na sinagoga, Ele procurava, procurava todo o dia na rua, procurava as pessoas»

                                                                    Papa Francisco

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Explicação (nos vinte anos do nosso casamento)



Segredo ancestral das sombras góticas
Que espera paciente a hora certa
Em que um raio de sol sobre um vitral
Despertará o Rei desaparecido
De um sono de estepes invernosas
Para a luz ágil de algum Maio
Que sonhe com oiro e com trigais:

É desta matéria volátil mas real
Que é feito e vive o nosso amor.


19/2/2014

Fernando Henrique de Passos

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A face comovida de Jesus


     Oh Jesus, meu Bom Deus, é hoje a Tua Noite de Natal! Mas… o que vejo? Vejo as Tuas faces pálidas pelos muitos que rejeitam o amor dos irmãos; as Tuas faces angustiadas pelos que perseveram em não reconhecer os seus pecados; as Tuas faces caídas de tristeza pelos que nada querem receber dos pobres, porque são ricos. As Tuas faces desmaiadas ao veres aqueles que recusam a companhia dos irmãos porque o orgulho não os deixa ver que estão sozinhos.
     Como deves estar magoado, oh Jesus nosso! Na Tua Noite de Natal não vês a alegria do encontro fraterno dos que estão divididos nas vontades. E, mesmo assim, abres os braços porque vês os que não desejam a solidão e sentem saudade do irmão.  Perdoa, Pai, o orgulho que nos afasta uns dos outros e não deixes de ensinar-nos a humildade como naquele Dia em que Tu, coberto de vexames, já a ficar com o corpo desfigurado, dependurado na vileza do madeiro, sentias a alegria da companhia do bandido arrependido, a Teu lado. 
     Nesta Tua Noite de Natal peço, um pouco a tactear a Tua bênção, por todos os que sofrem o desespero da doença, peço a Tua imensa piedade. E peço-Te (atrevimento meu) que cries uma grande família com o cimento do amor a esculpir a verdadeira terra da comunhão. Que sejamos, enfim, capazes de criar laços para o grande Banquete, Contigo, no reino do Pai! Não nos largues das tuas mãos até ao fim dos tempos! Que a Tua carne, esfacelada na cruz, ressuscite todos os dias no mundo, para nos salvar das pedras em que tropeçamos a cada momento.
    
Dezembro de 2013

Teresa Ferrer Passos

A propósito do Dia Mundial do Doente




«Três anos após ter sofrido um atentado na praça de S. Pedro em Roma, experimentando por conta própria o limite da vida, João Paulo II publicou a 11 de Fevereiro de 1984 a carta encíclica sobre o sentido cristão do sofrimento (Salvifici Doloris).»

«É inesquecível a última aparição pública do Papa João Paulo II: no limiar das forças físicas, foi conduzido à janela do “Angelus”, tentando sofregamente dizer algumas palavras à multidão que estava na Praça de S. Pedro e não o conseguindo fazer.»

«Uma bala entrou no corpo do Papa João Paulo II. Saiu-lhe em palavras ensanguentadas na Salvifici Doloris. Trinta anos depois, que entre uma bala no corpo muralhado da Igreja. Quem sabe, ela se esvai em forma de testemunho.»

                               Padre José Vilaça (excerto de artigo «Uma bala... trinta anos depois» publicado em 4 de Fervereiro no “site” da Arquidiocese de Braga)

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

?


Faz-te esponja.
Mergulha na pergunta.
Deixa-te embeber pela pergunta.

Vai mais longe:
Dissolve-te agora na pergunta
E esquece-te de ti, primeiro,
E depois, dela.

Quando acordares
Procura entre os cristais
Depositados no fundo dos ecos dos teus sonhos.

A pergunta que olhaste tanto tempo
Aí habita agora
Na sua nova forma –
Isto é, como resposta.


1/2/2014

Fernando Henrique de Passos

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

4 de Fevereiro - Martírio de S. João de Brito

S. João de Brito
Missionário Jesuíta e Mártir (1/3/1647 - 4 /2/1693)

«A culpa de que me acusam vem de ser que ensino a lei de Deus Nosso Senhor, e que de nenhuma maneira hão-de ser adorados os ídolos. Quando a culpa é virtude, o padecer é glória.»

                   Excerto de uma carta do Padre jesuíta João de Brito do cárcere de Oriyur na Índia, na véspera do martírio, dirigida ao Superior da Missão de Maduré, Padre Lainez.


«Como não lembrar, entre outros, aqui em Lisboa, o exemplo de São João de Brito, jovem lisboeta que, deixando a vida fácil da Corte de Portugal, partiu para a Índia, a anunciar o Evangelho da Salvação aos mais pobres e desprotegidos, identificando-se com eles e selando a sua fidelidade a Cristo e aos irmãos com o testemunho do martírio?»

                                                                           João Paulo II, falando aos jovens em Lisboa (Parque Eduardo VII), a 14 de Maio de 1982.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

A interrogação

A interrogação é côncava e fechada:
Gruta uterina que constrói
A resposta há eras aguardada.


3/2/2014

Fernando Henrique de Passos